Arteterapia: A arte em função do bem-estar

Daniely Botega
3 min readJun 12, 2020
Fonte: ItaúCultural

“ A satisfação do impulso criativo é uma necessidade biológica básica, essencial a saúde do indivíduo… A arte é um dos poucos meios importantes conhecidos pelo homem para a articulação desse impulso.” — Mark Rothko

A arte nos proporciona uma forma de apreensão e expressão do mundo, interno e externo. Uma comunicação que nos permite muitas vezes romper o véu que separa o real e o imaginário, é como um vocabulário com o poder de dizer o que muitas vezes não poderia ser dito de outra forma. E mesmo quando se baseia em uma cópia do real, traz um olhar subjetivo.

É uma maneira de se colocar no mundo de forma singular, a partir da descrição ou transformação dos objetos, ou ainda usando o próprio corpo. Por explorar a subjetividade ela pode promover uma experiência terapêutica, auxiliando no encontro da identidade e reestruturação. No seu uso terapêutico não há necessidade de conhecimento técnico, não é sobre técnicas, beleza ou cópia. Também não é uma ferramenta de cura, mas de auto-expressão e comunicação. O sujeito utiliza de uma linguagem além do filtro da linguagem verbal comumente disponibilizada em uma sessão de psicoterapia, por exemplo. Este encontro com a arte pode se aprofundar e ir além da relação terapêutica. Assim como com Yayoi Kusama, um dos maiores nomes da arte contemporânea, que traduz suas alucinações em pinturas e instalações.

Yayoi Kusama/Fonte: Luddite Robot

No Brasil temos o exemplo da importância da prática artística e cultural como uma ferramenta terapêutica quando Nise da Silveira usou da arteterapia para dar voz aos loucos do Centro Psiquiátrico do Engenho de Dentro. Dessa forma Nise lutou para os afastar das outras terapias que os calavam e deslegitimavam. Este trabalho foi muito grandioso, e a partir da reabilitação psicossocial trouxe à luz alguns artistas como Emygdio de Barros e Rafael Domingues.

Emygdio de Barros/Fonte: BlogIMS

O acesso à cultura e sua prática não pode ser entendida como um luxo, ela também é um fator de inclusão social e bem-estar. E torna possível que a nossa visão de mundo se amplie, criando uma pluralidade e encontro de novas identidades, explorando a diversidade através desse diálogo de imagens, sons e sensações. Essa relação entre saúde mental e arte vai além daquele que cria e também passa por quem é espectador. Além do lazer, entrar em contato com alguma expressão artística também possibilita o contato com algo interno, criar uma conexão com o que o artista produziu, e imaginar o que ele quis dizer, se é o mesmo que você sentiu ao se deparar com a obra. É interessante quando conseguimos achar algo nosso na produção do outro. A possibilidade de identificar na angústia do artista a sua angústia. É como se aquilo que você não consegue expressar tomasse forma bem a sua frente.

Fazer arte também é uma forma de promover bem-estar. É fazer sentir, mobilizar sentimentos e sensações, formas e cores. Foi com arte que Nise da Silveira trouxe individualidade aos seus pacientes, e rompeu com a cultura da loucura, que os marginalizava e excluía. Por tudo isso pensar na acessibilidade a arte é importante, seja ela qual for. Que esse acesso consiga romper as barreiras de classes e culturas, e não seja explorado apenas por um nicho privilegiado, e possa cada vez mais ser visto como uma forma de promover bem-estar psicossocial, transformação e inclusão.

“A cultura pode então ser instrumento na transformação do lugar social da loucura. A cultura produzida pelos sujeitos que viveram ou vivem a experiência do sofrimento, da medicalização, da discriminação e do estigma, produzindo novos significados, novos sentidos, um novo imaginário social: “Não existe ‘folclore’ — o que existe é cultura […] Cultura como usina de símbolos de um povo. Cultura como conjunto de signos de cada comunidade e de toda a nação” — Paulo Amarante; Eduardo Henrique Guimarães Torre, 2017.

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